Madeira ilegal usada na produção de carne
A empresa
JBS Friboi (Bertin).
Perfil
Em setembro de 2009, JBS Friboi e Bertin anunciaram a fusão de suas operações, criando a maior companhia do mundo no segmento de proteína animal. O mega-frigorífico tem, entre outros acionistas, o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), que responde por pelo menos um quinto do capital total do grupo. A empresa resultante dessa união, comandada pelo JBS Friboi, emprega cerca de 120 mil funcionários em todo o mundo. Ela detém quase 25% do mercado brasileiro de carne bovina e sua receita superou a casa dos R$ 40 bilhões, em 2010.
O problema
Uma planta industrial do grupo adquiriu madeira de empresa que já recebeu matéria-prima de fazenda com área embargada pelo Ibama.
O caso
A unidade do frigorífico Bertin, localizada no município de Tucumã (PA) e atualmente controlada pelo JBS Friboi, adquiriu por diversas vezes, entre maio e setembro de 2010, resíduos de madeira da Projeto Industrial Madeireira e Transportes Ltda. A carga era utilizada em atividades internas de geração de energia, principalmente no abastecimento de caldeiras. A empresa Projeto Industrial, por sua vez, recebeu em 2010, segundo registros oficiais, toras de madeira nativa da Fazenda Rio Tigre, que faz parte da lista de embargos do Ibama por desmatamento ilegal.
Ao vistoriarem a Rio Tigre em janeiro de 2011, fiscais do Ibama identificaram fraudes no plano de manejo aprovado pela Secretaria Estadual de Meio Ambiente (Sema). Apesar de autorizada a explorar milhares de metros cúbicos de madeira nativa amazônica, a propriedade não possuía sequer uma floresta com potencial madeireiro em seus limites – havia apenas no local matas secundárias e pastos degradados. De acordo com o Ibama em Marabá, a fraude serviu para colocar no mercado, como se fosse legal, milhares de metros cúbicos de madeira de desmatamento provenientes de outros locais, no sul e sudeste do estado.
A Fazenda Rio Tigre foi arrendada e administrada pela Agropecuária Santa Bárbara Xinguara até abril de 2009. Um ano antes, em 2008, fiscais do Ibama autuaram a empresa e embargaram mais de 2,5 mil hectares de terras no local. Também Rosenval Alves dos Santos, o proprietário original da área – e quem vendeu a madeira para a Projeto Industrial –, possui embargo ambiental na Rio Tigre, lavrado pelo Instituto ainda em 2006. Até julho de 2009, ele integrou a “lista suja” do trabalho escravo, cadastro mantido pelo governo federal, por conta de uma libertação de 78 pessoas que trabalhavam para ele nesta mesma fazenda, em 2004.
Braço do agronegócio do Grupo Opportunity, controlado pelo banqueiro Daniel Dantas, a Agropecuária Santa Bárbara Xinguara controla mais de 500 mil hectares de terra no sul do Pará, uma área equivalente a três municípios de São Paulo, onde pastam mais de meio milhão de cabeças de gado. Ela também virou alvo de ações do Ministério Público Federal do Pará (MPF-PA) por devastação da floresta amazônica em nove fazendas espalhadas por cinco municípios. A Procuradoria Geral do Estado do Pará (PGE-PA) também briga na Justiça com a empresa pela propriedade de fazendas que, no entendimento do governo estadual, constituem terras públicas.
Relação com o consumidor paulistano
O JBS Friboi abastece as principais redes de supermercados de São Paulo (SP), como Pão de Açúcar, Walmart, Sonda e Carrefour.
O que dizem as empresas
Por meio de sua assessoria de imprensa, o JBS Friboi respondeu aos questionamentos sobre suas relações comerciais com a Projeto Industrial Madeireira e Transporte. “O JBS informa que ao iniciar aquisição de madeira da empresa referida, também segue as leis vigentes de legalização desta matéria-prima. Para conhecimento, ao receber a madeira em qualquer uma de suas unidades, a JBS solicita a GF- Guia Florestal e também a CEPROF – Cadastro de Exploradores e Consumidores de Produtos Florestais, não constando nenhuma ilegalidade em relação à madeira adquirida da empresa referida”. Apesar de contar com a documentação relativa à compra da madeira, a assessoria do grupo não informou se dispõe de instrumentos adicionais de controle para garantir que a matéria-prima não seja proveniente de áreas embargadas.
As redes de supermercados também se pronunciaram. Em nota, o Grupo Pão de Açúcar afirma que “solicitou imediatamente esclarecimento por parte dos fornecedores envolvidos”. Além disso, a resposta da companhia diz ainda que, “confirmadas as evidências, tomará medidas cabíveis, como a suspensão dos contratos de fornecimento, até que a situação esteja resolvida”.
Já o Walmart, signatário do Pacto Nacional pela Erradicação do Trabalho Escravo e dos pactos setoriais do Conexões Sustentáveis, declarou que, nos últimos anos, vem desenvolvendo diversas ações visando adequar os produtos que comercializa aos critérios de ambas as iniciativas. Um exemplo é a adoção, em seus contratos juntos a fornecedores, de cláusulas específicas para atender os referidos pactos. “Temos mantido discussões constantes com os fornecedores indicados no estudo para buscar as soluções necessárias. Estamos, nesse momento, retornando os questionamentos a estas empresas sobre a efetividade das ferramentas e métodos utilizados”, declara o Walmart através de nota emitida pela Vice Presidência de Assuntos Corporativos e Sustentabilidade.
Procurado, o grupo Sonda não se manifestou.
Por, fim o Carrefour informou, através de nota, que tem um rígido controle para evitar, em todas as linhas de produto que comercializa, compras de áreas que violam as legislações ambientais e trabalhistas. Em relação aos seus fornecedores listados no estudo, a empresa afirma ter entrado em contato solicitando esclarecimentos frente aos fatos relatados. “Foi informado que as compras de matéria-prima ou insumos não foram realizadas em áreas embargadas ou constantes da lista suja”, diz o Carrefour.
Mais uma vez, é importante esclarecer que, de acordo os pactos do Conexões Sustentáveis – que têm o Carrefour como signatário –, as empresas não devem adquirir insumos provenientes de quaisquer empreendimentos pertencentes a fornecedores incluídos na lista de embargos do Ibama ou na “lista suja” do trabalho escravo, publicada pelo Ministério do Trabalho e Emprego (MTE). Ou seja, o compromisso não se restringe apenas à área específica que constar de uma dessas duas listas.
Anexo
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