O sojeiro que usou trabalho escravo
As empresas
Cargill e Louis Dreyfus.
Perfil
Sediada em Mineápolis, nos Estados Unidos, a Cargill é uma das principais companhias de comércio e processamento de commodities agrícolas em todo o mundo. Atuando no Brasil desde 1965, ocupa o posto de maior exportadora de soja do país e emprega cerca de 6 mil funcionários.
Assim como a Cargill, a companhia francesa Louis Dreyfus – cujos negócios no Brasil estão sediados em São Paulo (SP) – também é uma das líderes do agronegócio mundial. No Brasil, atua no comércio e na exportação de soja, milho, algodão e café, além de investir na produção de etanol de cana-de-açúcar.
O problema
As empresas adquiriram soja de produtor que figura na “lista suja” do trabalho escravo, mantida pelo Ministério do Trabalho e Emprego (MTE).
O caso
Olavo Demari Webber ingressou na “lista suja” em julho de 2009 por submeter a condições desumanas de trabalho pelo menos duas dezenas de funcionários em sua fazenda denominada Boa Sorte, no município de Porto dos Gaúchos (MT). Segundo relato dos auditores fiscais do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE), os trabalhadores preparavam o pasto para o gado, mas sofriam ameaças e agressões físicas durante o expediente. Eles não tinham registro em carteira e também sofriam com descontos em seus pagamentos pela utilização de equipamentos de proteção individual – o que é terminantemente proibido por lei. Além disso, os alojamentos não tinham instalações sanitárias e seis pessoas chegaram a ser acomodadas por meses em um barraco de lona.
Além de criar gado bovino, Olavo Demari Webber possui diversas fazendas em outros municípios de Mato Grosso onde também produz grãos. Em 2010, a unidade de Ipiranga do Norte (MT) da Louis Dreyfus adquiriu soja do produtor. A unidade de Sorriso (MT) da Cargill também recebeu milho, em setembro de 2009, e soja (em abril de 2010) de Olavo Demari Webber.
É importante ressaltar que essas relações comerciais foram realizadas enquanto o produtor figurava na “lista suja” do trabalho escravo. E também vale lembrar que os pactos empresariais do Conexões Sustentáveis São Paulo – Amazônia prevêem o corte de relacionamento com quaisquer produtores que constem dessa relação do MTE, independentemente da fazenda em que tenham ocorrido os problemas.
Olavo Demari Webber foi retirado da “lista suja” em 22 de dezembro de 2010 graças a uma liminar judicial. Coincidentemente, ele obteve tal direito após seus compradores terem sido informados de sua situação e se comprometido a tomar providências. O Ministério do Trabalho e Emprego e a Advocacia Geral da União afirmaram que estão recorrendo na Justiça para devolver o produtor à lista.
Relação com o consumidor paulistano
A Cargill fabrica conhecidas marcas de óleo, como Liza, Maria, Mazola, o azeite Gallo e a maionese Gourmet. Esses produtos podem ser encontrados nas principais redes de supermercados de São Paulo, como Pão de Açúcar, Walmart, Sonda e Carrefour.
O que dizem as empresas
Por meio de sua assessoria de imprensa, a Louis Dreyfus informou que a “aquisição de soja do produtor mencionado foi um caso pontual, entre mais de 6.000 fornecedores de soja e milho contratados pela companhia em 2010, e decorreu de um equívoco de um de seus compradores”. A nota ainda sustenta que a empresa tem por política restringir a aquisição de produtos de quaisquer fornecedores cujos nomes apareçam na “lista suja” do trabalho escravo. Porém, o funcionário que fechou o negócio entendeu que poderia fazer a comercialização, tendo em vista que o imóvel que aparece na relação do Ministério do Trabalho e Emprego não é o mesmo em que foi produzida a mercadoria adquirida pela Dreyfus. No entanto, a companhia garante que “já renovou o treinamento de seus funcionários quanto à correta aplicação de sua política e ressalta que já não possui qualquer relacionamento comercial com o citado produtor”.
Já a Cargill também admite que “deveria haver um bloqueio desse produtor no sistema, o que não ocorreu nesse caso, e que impediria a compra”. Segundo a direção da empresa, pode ter ocorrido uma falha técnica ou uma “má interpretação” por parte do funcionário responsável pelo fechamento dos negócios em âmbito local. Porém, a Cargill afirma ter avaliado possíveis falhas nas transações nos últimos três anos e diz não ter identificado nenhum caso similar. Por fim, a empresa sustenta que “tratou-se de um problema pontual” e que “já foram tomadas providências para correção desses pontos”.
As redes de supermercados também se pronunciaram. Em nota, o Grupo Pão de Açúcar afirma que “solicitou imediatamente esclarecimento por parte dos fornecedores envolvidos”. Além disso, a resposta da companhia diz ainda que, “confirmadas as evidências, tomará medidas cabíveis, como a suspensão dos contratos de fornecimento, até que a situação esteja resolvida”.
Já o Walmart, signatário do Pacto Nacional pela Erradicação do Trabalho Escravo e dos pactos setoriais do Conexões Sustentáveis, declarou que nos últimos anos vem desenvolvendo diversas ações visando adequar os produtos que comercializa aos critérios de ambas as iniciativas. Um exemplo é a adoção, em seus contratos juntos a fornecedores, de cláusulas específicas para atender os referidos pactos. “Temos mantido discussões constantes com os fornecedores indicados no estudo para buscar as soluções necessárias. Estamos, nesse momento, retornando os questionamentos a estas empresas sobre a efetividade das ferramentas e métodos utilizados”, declara o Walmart através de nota emitida pela Vice Presidência de Assuntos Corporativos e Sustentabilidade.
Procurado, o grupo Sonda não se manifestou.
Por fim, o Carrefour informou, através de nota, que tem um rígido controle para evitar, em todas as linhas de produto que comercializa, compras de áreas que violam as legislações ambientais e trabalhistas. Em relação aos seus fornecedores listados no estudo, a empresa afirma ter entrado em contato solicitando esclarecimentos frente aos fatos relatados. “Foi informado que as compras de matéria-prima ou insumos não foram realizadas em áreas embargadas ou constantes da lista suja”, diz o Carrefour.
Mais uma vez, é importante esclarecer que, de acordo os pactos do Conexões Sustentáveis – que têm o Carrefour como signatário –, as empresas não devem adquirir insumos provenientes de quaisquer empreendimentos pertencentes a fornecedores incluídos na lista de embargos do Ibama ou na “lista suja” do trabalho escravo, publicada pelo Ministério do Trabalho e Emprego (MTE). Ou seja, o compromisso não se restringe apenas à área específica que constar de uma dessas duas listas.
Anexo
Clique aqui para acessar um PDF com a íntegra do posicionamento das empresas.
[…] Fabricante dos óleos Liza, Maria, Mazola e maionese Gourmet compra soja de produtor acusado de escravizar trabalhadores http://reporterbrasil.org.br/conexoes/?p=133 […]
[…] da soja, Bunge (envolvida em dois casos, aqui e aqui) e Cargill (também em dois casos, aqui e aqui), Multigrain, Company, ADM do Brasil, Louis Dreyfus, Noble Group e Caramuru. No ramo da madeira, […]